quinta-feira, 12 de junho de 2008

Hoje é dia dos namorados: Para comemorar uma história romântica dos tribunais


Publicações: O Estado de S. Paulo - Political News
Fonte: Agência Estado

Data: 8 de Junho de 2008



Ayres Britto vira o ministro pop' do Supremo


Ele não é, dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), o que mais se envolve em polêmicas ou discussões ríspidas. Também não é dos que fazem declarações bombásticas, que repercutem nacionalmente. Mas, quando o assunto é processo espinhoso, em especial os que envolvem questões sociais que dividem a opinião pública, Carlos Augusto Ayres de Freitas Britto, 66 anos, sergipano de Propriá, tem sido um protagonista da Corte Suprema. O ministro destaca-se julgando a constitucionalidade das pesquisas com células-tronco embrionárias, a truculência da Lei de Imprensa em pleno regime democrático e outros assuntos sisudos, mas também tem marcado seus votos por um jeito pop de discutir os "processos da vida" que chegam ao STF.

A semana passada registrou uma amostra desse perfil: foi o único ministro a votar pela concessão de pensão pós-morte a Joana da Paixão Luz, amante por 37 anos do fiscal de rendas baiano Valdemar do Amor Divino Santos, que era casado com outra mulher. Derrotado, saiu-se com esta: "O encontro dos dois estava escrito nas estrelas. É o encontro entre o Amor e a Paixão". Para ele, os nomes não eram apenas coincidência. "Aquilo era um sinal." Sem conseguir convencer os colegas, admitiu no dia seguinte ter ficado triste com a decisão: "Não consegui dormir à noite." Por posições como essa, admite que setores da sociedade, como a Igreja Católica, resistam às suas posições no Supremo. "O juiz que não tiver desassombro no plano das idéias, que pegue o boné e vá embora." Foi ele o relator da ação direta de inconstitucionalidade que contestava a legalidade de pesquisas com células-tronco embrionárias - tema que, no limite, levou o STF a discutir qual seria, segundo a Constituição, o momento em que a vida começa. Passado esse julgamento, do qual saiu vencedor, com a aprovação das pesquisas, Britto ainda tem pela frente uma considerável fileira de assuntos igualmente controversos. A lista começa pela ação proposta contra o Programa Universidade para Todos (Prouni), que discute, entre outros pontos, a legalidade da imposição de cotas sociais e raciais no ingresso de alunos nas universidades do País. Tem, ainda, a ação proposta pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, que pede o reconhecimento legal do casamento de pessoas do mesmo sexo e a discussão sobre a legalidade da demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol. Foi dele, também, o voto de relator no julgamento liminar da constitucionalidade da Lei de Imprensa herdada da ditadura militar (1964-1985) - o plenário do STF decidiu suspender duas dezenas de artigos por entender que estavam em flagrante desrespeito a direitos previstos na Constituição. Todos os processos que chegam ao Supremo, a não ser que devam ficar sob os cuidados de determinado ministro por já relatar caso correlato, são distribuídos por sorteio, do qual só não participa o presidente do STF. Nos últimos meses, os processos de maior ressonância pública têm caído no colo de Britto por puro azar. Ou sorte, como ele acredita. "Eu gosto disso. É um desafio."



Considerado pelos colegas um liberal, Britto já votou a favor da legalidade do programa de cotas, julgamento que pode ser retomado no segundo semestre. Por isso, os colegas já esperam um voto em favor também do casamento de pessoas do mesmo sexo e, com um pouco mais de dúvida, em favor da demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol. "Sou apenas uma pessoa aberta, receptiva", disse o ministro ao Estado. "Mas não perco de vista o referencial do direito posto. Vou sempre à Constituição. Se os votos são mais avançados é porque a Constituição é mais avançada." Candidato a deputado federal pelo PT em 1990, ele foi considerado a escolha mais partidária do presidente Lula, e era tido, ao chegar ao STF, em junho de 2003, como um voto fechado com os interesses do Planalto. Mas o advogado, ex-consultor-geral de Sergipe e ex-professor de direito constitucional não demonstra nenhum alinhamento automático com o governo.



Na semana passada mais um assunto polêmico foi mandado para o seu gabinete. Dessa vez não envolve teses sociais: será relator do inquérito aberto a pedido do Ministério Público para investigar a participação do deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho da Força Sindical, no esquema de desvio de recursos públicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em processos com indícios de corrupção, Britto não apresenta nenhuma liberalidade - ao contrário. Foi ele, por exemplo, um dos entusiastas da tese de que políticos com a ficha suja sejam barrados pelos tribunais eleitorais e impedidos de se candidatar. Por sinal, esse é mais um imbróglio que terá de resolver nos próximos meses, agora como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).